Caixa preta

terça-feira, 10 de agosto de 2010


Moro nessa mesma casa há trinta e nove anos, mudei quando tinha apenas seis. Quando eu era criança, ela tinha apenas um andar, muros baixos, garagem pequena, quintal repleto de árvores e plantas. O tempo foi passando e, lentamente, a vegetação ia sendo levada. Eu crescia, os portões e o espaço para os carros também. Aqui passei os melhores momentos da minha vida, tive uma infância rica de diversão. Na adolescência foi construída a piscina. Como sou filha única, subiram mais um andar quando casei. Morei com meu marido e meu filho aqui nos últimos e incríveis doze anos. Nesse meio tempo construímos um escritório, uma sala de jogos, implantamos um sistema de segurança e fizemos a área da churrasqueira. Vimos os vizinhos partirem, os novos chegarem, as casas antigas vendidas e suas substituições verticais. Todas as mudanças nunca pareciam chegar perto. Era a nossa vez.
Arrumando, empacotando, empilhando, guardando, tirando, quebrando, limpando, colocando, descendo, subindo, ligando, avisando, pedindo, despedindo. Tudo pronto, só nos resta o espaço vazio, as histórias diversas. "Ô Lara, olha se não ficou nada aí e leva a chave para a mobiliária que eu vou descendo com o caminhão!" Algumas lágrimas rolaram naturalmente. No quarto do Joãozinho nada, nem no meu. O escritório ainda tinha alguns papéis: completamente dispensáveis. Olhei pela cozinha, passei pela sala: nada. Cheguei no quarto dos meus pais, já tinham deixado claro que não precisava de revisão, resolvi conferir, afinal, estão quase na sétima casa. No chão do quarto nem do banheiro nem poeira. Estava de saída e, para garantir, os armários. No alto do armário do papai notei uma caixa preta fixada no canto direito. Desconhecia a existencia desse compartimento, levada pela curiosidade peguei um alicate e consegui desprender a caixa. Caiu como um fruto madur. Para minha supresa ela era absurdamente pesada.