Abacaxi com hortelã

quarta-feira, 5 de maio de 2010


Era uma vez um abacaxi. O pobrezinho foi plantado com o propósito de ser feito de suco, nasceu sabendo disso e aguardava nada ansioso, pelo dia em que seria transformado. Sem ambições nem maiores propósitos na vida, já havia se conformado, sem lutar para mudar seu destino. Outras frutas que também tinham sido plantadas para fins líquidos e nutritivos tentavam desesperadamente fugir - algumas até conseguiam - e estranhavam a fácil aceitação de um destino tão triste quanto o delas. Não querendo ser contestado sobre sua opção de vida, o abacaxi não dava papo para as frutas. Não deu muita bola quando lhe disseram que seu fim estava próximo, e que haviam escutado cozinheiros falando que ele não seria triturado sozinho. Elas o ofereceram ajuda, planejaram uma rebelião. Não interessado, o abacaxi foi dormir. Assim que acordou sentiu um cheiro forte, diferente. Pensou ser uma fruta nova e enxerida, desafiando os limites de comunicação que ele colocara. Quando foi averiguar, descobriu que não se tratava de uma fruta, e sim de uma folhinha aveludada - hortelã. Perguntou o que ela estava fazendo ali e ela lhe disse que viraria suco. Mas não parecia compartilhar nem da opinião das frutas nem da do abacaxi sobre a vida que lhe fora destinada; parecia contente. Disse-lhe que servia a um propósito maior, e que não se importava em dar a vida para melhorar o sabor de um suco. Disse também que o abacaxi deveria se sentir honrado em ser a fruta principal de um suco. O abacaxi soube que ela nunca entenderia: não era honra virar suco, era fato. Para isso são feitas as frutas, e é pro liquidificador que elas vão. Pensou em discutir teorias, mostrar para hortelã a dura realidade do mundo, mas descobriu-se alegre com a nova companhia, e ficou surpreso ao se ver contente, já que não seria um suco qualquer. Seria um suco de abacaxi desgraçado com hortelã sonhadora.