Servantes

sábado, 12 de junho de 2010


Meliza era uma mulher valente, bióloga recém formada, amante das tartarugas desde muito jovem. Nascida em Rio Acima, viveu por muitos anos isolada nos montes mineiros, mas foi em uma viagem ao litoral com seus colegas de escola que se descobriu.
Apaixonou-se pelo jeito manhoso dos nativos, pela água quente e azul, e pela idéia politicamente correta de vida sustentável. Ser ecologicamente consciente estava na moda e combinaria muito bem com seu estilo “hiponga”. Teve convicção de que seu destino era abandonar sua vida na Grande BH e criar uma nova em Trindade. A crise dos vinte anos se aproximava. Aquela seria uma atitude ousada o suficiente para fazer jus à fase que passava.
Quando desfazia as malas, reorganizava sua coleção de postais sentiu necessidade de conversar. Mel sempre foi comunicativa, a mais das quatro irmãs. Sempre viveu com cinco amigos pendurados no pescoço, mas agora morava sozinha em uma ilha de desconhecidos. Teve medo, quase ficou triste. Safa como sempre foi, decidiu matar saudade em um dos milhares de sites de relacionamento ao qual fazia parte. Foi assim que tudo começou.
Horas e mais horas que antes seriam gastas com o aprofundamento no estudo do habitat marinho, passaram a ser utilizadas em outros tipos de pesquisa. Estas não exatamente colaboram com o desenvolvimento científico, mas expressam uma característica marcante de Meliza Servantes: a curiosidade enrustida. Começou fuçando profiles de Orkut, depois googling colegas e amigos, depois amigos dos colegas e amigos. Blogs, Forms, dedicatórias em trabalhos de mestrado, entrevistas a programas esportivos; qualquer informação era útil. Tornou-se referência, ou fonte de informação. Conhecia alguns desconhecidos melhor do que Inteligência brasileira jamais seria capaz de conhecer. Em momentos de distração se entregava: “Ahhh, aquele rapaz da outra turma! Sei quem é. O pai dele trabalhou na Colômbia e foi transferido pra uma área controlada pelas Farc. Eles foram ameaçados de morte e voltaram pra casa”. “Como você sabe disso?” perguntariam assombrados e como sempre responderia “ELES” – “Alguém me contou, mas não lembro quem”.
Mel tinha muitos talentos: exímia nadadora, fantástica doceira, super habilidosa em trabalhos manuais e ainda era detetive nas horas vagas.